Por Marco Antonio L.
Da ABLGT
Por Toni Reis*
Testemunhei pessoalmente o troca-troca na Câmara dos Deputados na semana passada (6 e 7 de março) para eleger o presidente e indicar integrantes da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, criada há 18 anos para institucionalizar a luta pela igualdade e contra a discriminação.
Foi escandaloso, vergonhoso e inaceitável. Vi com meus próprios olhos a manipulação e o jogo de interesses. Vi o machismo e autoritarismo desrespeitosos do líder do PSC para com a deputada Antônia Lúcia (PSC/AC). Tive a infelicidade de ouvir Jair Bolsanaro (PP/RJ) falar que foi o melhor presente de aniversário e natal que já teve de todos os tempos.
Oito deputados do mesmo partido numa só Comissão não é coincidência, é trampa, e a maioria é ligada ao fundamentalismo religioso evangélico. Ao total, agora 13 dos 18 titulares da Comissão são pastores. Estuprar a proporcionalidade da representação partidária na Comissão está equivocado e fere o Regimento Interno da Câmara: as Comissões devem ser plurais.
Com essa eleição, a Câmara dos Deputados rasgou a Constituição Federal e a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Tornou-se, mais uma vez, uma vergonha para o Brasil e para o mundo. O Parlamento Brasileiro retornou à idade das trevas. É preciso que os (as) parlamentares relembrem e ajam de acordo com o princípio (e a lei) de que o Brasil é um Estado Laico. Com a ascendência do fundamentalismo religioso no Congresso Nacional, assiste-se a um espetáculo que relembra o surgimento da tomada do poder pelos nazistas na Alemanha dos anos 1930.
O episódio foi especialmente vergonhoso pela conivência do PMDB, PSDB, PR, PTB e PP em cederem vagas na Comissão para o PSC, além da incabível indicação de Jair Bolsonaro (PP/RJ) para integrá-la, bem como o PSB, o PSD e o PV indicando pastores em detrimento de pessoas historicamente atuantes no campo dos direitos humanos.
As origens de alguns desses partidos simbolizam a luta pela democracia e o rechaço ao autoritarismo no Brasil da Abertura. Quem diria?! Das 20 Comissões Permanentes da Câmara dos Deputados, a de Direitos Humanos foi a penúltima a ser escolhida, mostrando uma falta de prioridade generalizada.
Não é de se surpreender a estimativa de que uma pessoa é assassinada a cada 10 minutos no Brasil (Instituto Sangari, 2011) e que em 2011, segundo o UNODC, o país estava em primeiro lugar no ranking do mundo neste quesito. O exemplo vem de cima, o Congresso Nacional não está preocupado com os direitos humanos e as consequências que este descaso traz.
Decepcionou também a falta de prioridade dada pelo PT e pelo PCdoB. Uma pergunta que ficou no ar é por que o PT priorizou a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional em detrimento da Comissão de Direitos Humanos e Minorias?
Repetiu-se mais uma vez a imperdoável negociação dos direitos humanos em troca de interesses políticos e do projeto de manutenção do poder, o que – no caso da população LGBT, negra, mulheres, indígenas – tem se tornado corriqueiro na atual legislatura. Estamos cansados (as) de ser moeda de troca.
É uma aberração eleger para presidir a Comissão de Direitos Humanos e Minorias uma pessoa que é objeto de inquérito no Supremo Tribunal Federal, acusada de estelionato, racismo e homofobia.
Não faltam exemplos nas redes sociais comprovando algumas dessas alegações contra o Pastor Marco Feliciano (PSC/SP), eleito presidente da Comissão em 07 de março:
* Em 30 de março de 2011, afirmou em sua página no Twitter, que os africanos são descendentes de um “ancestral amaldiçoado por Noé” e que “sobre o continente africano repousa a maldição do paganismo, ocultismo, misérias, doenças oriundas de lá: ebola, Aids, fome…”;
No seguinte link consta vídeo no qual afirmou que “a Aids é uma doença gay”; que existe um ativismo gay promovido por satanás que está “infiltrado” no governo brasileiro; que “enquanto crentes não saem para evangelizar… satanás levantou o seu ativismo [das pessoas LGBT] neste país. Ação de satanás contra a família brasileira”; que o problema é o ativismo gay, o problema são pessoas que têm na sua cabeça o engendramento de satanás”; “são homens e mulheres que usam dos mesmos mecanismos que Stanley usou no seu comunismo nazista, usam a mesma linguagem de Hitler… uma mentira contada várias vezes com muita ênfase se torna verdade”.
* Da mesma forma, no caso da censura presidencial ao vídeo da campanha do Ministério da Saúde de combate a DST/AIDS no carnaval de 2012, com personagens gays, o deputado Marco Feliciano não só comemorou a retirada do vídeo da campanha com o casal gay do ar como também creditou à Frente Evangélica o “feito”. Em seu Twitter, o deputado postou o link de uma matéria sobre a censura do material e sentenciou: “Pressão nossa”, numa clara demonstração da interferência religiosa na laicidade do Estado.
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